Palavras Obscuras - 1x10 - Assassino à Moda Antiga


Sinopse: Luana, cúmplice do namorado Raul, psicopata, perverso e narcisista, se vê às voltas como cúmplice, ocultando seus crimes. Sendo esse o terceiro episódio do seu amado, Luana não sabe que atitude tomar diante dos recorrentes episódios de violência que Raul se envolve. Ela conta com um acompanhamento da psicanalista Leticia, mas surpreendentemente o destino a coloco em frente a inspetora de polícia Betina, logo após o último crime de Raul.



Assassino à Moda Antiga
de Gabrielle Mastella de Oliveira

 

Naquela manhã acordou com uma agonia, sentia muita falta de ar, podia ser que um novo ataque de pânico estava próximo, desde seu último episódio procurou aumentar em mais um turno suas sessões com Letícia. Ofegante e bastante suada, Luana levantou bruscamente e saiu correndo em direção ao banheiro, à náusea fora tão forte que parecia ser vômito, mas não. Sentou-se sobre a privada e começou a respirar, prontamente o bip do celular anunciava que deveria despertar-se, já não sabia o motivo de ajustar o time, uma vez que não mais havia conseguido dormir sossegada. Encontrar aquelas coisas estranhas, desconexas escritas naquele diário de Raul, tornou sua vida mais difícil, nunca imaginou que aquelas poucas páginas mudariam sua vida.

Sem muito desligar-se, entrou para o banho, precisava estar despertar, estar ativa para poder atender seus pacientes com a mesma dedicação, carinho e competência de sempre, além de almoçar com uma amiga, recém-separada, precisava estar para os outros, não mais desejava pensar naquelas páginas, aquela leitura havia mudado a sua vida. Talvez se não tivesse procurado tanto por uma possível amante estivesse a salvo de descobrir aquele segredo. Agora o que precisava era uma forma discreta de levar a vida, sabendo da verdade. Não imaginava o quanto tudo aquilo poderia desconcertar as coisas, tinha a relação perfeito e em apenas alguns meses estaria casada com seu grande amor, como poderia desistir de tudo apenas por algumas páginas rabiscadas e talvez fruto de alguma fantasia, afinal Raul era conhecido por escrever muito bem e ser um exímio contador de histórias, poderiam aquelas páginas serem frutos de algumas taças a mais de vinho e muita criação, quem sabe?! Assim preferia comprazer seu íntimo acreditando apenas na sua verdade.

Dessa forma saiu rumo ao trabalho. Aguardava ansiosa a chegada da sua carona, quando percebeu que uma chama insistente, um número desconhecido, resolveu atender. Naquele instante suas pernas ficaram trêmulas, era a secretária de Raul pedindo sobre seu paradeiro, fazia uma semana que ele não aparecia no fórum. Um tanto constrangida, Luana respondeu que a princípio estava tudo bem e que Raul esteve com fortes dores de cabeça e acometido da crise de pânico costumeira, aquela que no impossibilitava de sair, algumas crises se estendiam por mais de quinze dias, mas com as sessões de terapia e os medicamentos, rapidamente eram controladas e dessa forma ele retomava as atividades forenses como se nada tivesse acontecido, sempre fora assim. A secretária, mais tranquila, encerrou a chamada telefônica pedindo que Luana avisasse Raul que algumas autoridades policiais compareceram no Fórum com um mandado, solicitaram o depoimento do magistrado para fins de esclarecimento pelo desaparecimento de uma jovem. Mais uma daquelas situações que Raul costumava arranjar para si depois de suas noites de orgias, era sempre a mesma dinâmica.

Estava tão acostumado a Raul , que nem ao menos tentava discutir sobre os detalhes daquele tipo de diversão que mais parecia pertencer a outro homem, não ao seu Raul, um homem delicado, empático e amável. Aquelas coisas todas pareciam não estar relacionada ao homem que ele havia escolhido para compartilhar sua vida, ou pelo menos ela tinha um homem com personalidade duplicadas, algo que sua psicanalista insistia em explicar, discorria sobre o fato, mas Luana decidida que poderia modificar algo preferia mentir para si mesma, mas as coisas parecia haver saído do controle, o noticiário anunciava um novo desaparecimento e Raul, há uma semana longe do fórum, tudo corroborava para a veracidade do que ela havia encontrado escrito naquele diário medonho, nefasto, que ela carregava de um lado para o outro, temendo que outro alguém encontrasse e fizesse com que ela admitisse que houvesse compartilhava sua vida com um assassino, frio e calculista, um homem narcisista que para satisfazer seus desejos mais medonhos, fazia qualquer coisa, até mesmo envolvê-la como cúmplice.

Nervosa, desligou o telefone e rapidamente pensou em busca por Raul em algum bordel do centro da cidade, ela conhecia quase todos os paradeiros do amado, agora era encarar aquela tarefa medonha e empreender suas buscas pelos guetos medonhos do centro da capital Porto-alegrense, temia que ele já estivesse morto, com a polícia ele não estaria senão já havia recebido a chamada, o que ele havia aprontado desta vez? O uber encostou e ela adentrou, deu uma direção, bastante afastada do centro, como o motorista do aplicativo aceitou sem questionar, nem bem se acomodou no banco traseiro, puxou o telefone e começou a verificar se havia algum sinal de Raul. Apenas os familiares preocupados e a secretária, Letícia, sua psicanalista, confirmando a consulto para o próximo dia e mais nada. O Uber seguiu, saindo aos poucos do centro em direção à zona sul, o endereço era num local no Belém Velho, quase sem placas de sinalização. Luana não temia mais nada, principalmente depois que iniciou sua relação com Raul, o segredo era encontrá-lo com vida e tentar amenizar as coisas, fossem elas quais fossem. O uber estava quase na frente de um sítio e assim o motorista, por ser um lugar ermo preocupou-se em deixar Luana, só, mas essa nem bem confirmou a numeração, saltou do carro, agradeceu com muita educação e abriu a porteira, o carro afastou-se devagar, talvez na esperança que aquela bela moça tomasse juízo, ou parasse de ter prazer com aquele estranho jogo perigoso, talvez.

Caminhando naquele pátio mal cuidado foi se aproximando da casa, em seguida pode perceber a figura de Raul na varanda. Desleixado, com roupas esportivas, sujas, cabelos desgrenhados e barba por fazer, nem bem se aproximaram ela pode sentir forte cheiro de álcool e de cigarro, possivelmente estava naquelas semanas que passava bebendo, fumando e se entorpecendo de drogas, quase sempre acompanhado de prostitutas, dessa vez parecia não contar com nenhuma companhia feminina e o que mais parecia estranho para Luana, era que nenhum de seus parceiros de festa estava por ali. Reconheceu a figura de Luana, mas quase que seu estado catatônico não demonstrou qualquer sinal de afeição ou simpatia, como se estivesse no automático pediu que ele ingressasse no interior da casa, balbuciando poucas palavras, apenas sinalizando com as mãos. Ao ingressar, Luana sentiu forte cheiro de urina e fezes, algumas garrafas de bebida espalhadas e muito lixo pelo chão, sobras de comida por todos os lados e ele pediu que ela fosse acompanhada. A Casa era grande, parecia haver sido habitada em algum momento, os móveis eram de muito bom gosto, acompanhando uma arquitetura requintada típica dos anos 60, mas já há algum tempo desabitada. Caminharam por um salão largo e rapidamente ingressaram num corredor escuro, passado isso seguiu para os fundos, onde estava uma casa que parecia estar destinada aos prestadores de serviço do local, dois quartos, um banheiro e uma das portas trancada com um cadeado. Raul, parecendo embriagado, tomou uma chave de um dos bolsos da bermuda e abriu, quando a porta foi cedendo, um forte cheiro entrou pelas narinas de Luana e a visão era algo aterrorizador, no fundo da sala jazia o corpo de uma jovem moça, desfigurada de sangue e já contando com alguns dias de decomposição, os restos da roupa brilhosa espalhadas pelo chão contrastavam com as marcas de sangue por todo o lado, a visão era medonha e Raul, parecia estar acostumado a tudo aquilo, precisava era livrar-se do corpo e sair dali direto para a clínica de reabilitação, para desintoxicar, mas antes precisavam encontrar o local ideal para ocultar o cadáver.

Luana, que das primeiras duas vezes havia se compadecido e acreditava na recuperação do amado, naquele instante já não sabia mais que atitude tomar, precisava raciocinar rápido e livrar-se daquela ceda, depois veria a melhor solução. Aproximou-se do corpo, o odor era forte, teve fortes náuseas, mas se conteve, precisava ser rápida, tirou a moça, com grande desenvoltura, enquanto o cambaleante Raul, tomava os últimos goles da garrafa de uísque, atirada no chão e começava a limpeza do local, forma horas organizando tudo, aquilo e levaram o corpo para a mata, onde já havia um buraco semiaberto e ali jogaram o corpo, ao redor, duas roseiras pareciam vivas, Luana olhou com certo sentimento, tratava-se de outros dois episódios violentos de Raul, mas a polícia nunca investigou, pois eram prostitutas e ninguém apareceu reclamando os corpos.

Saíram do matagal e rapidamente Luana chamou um uber, colocou o cambaleante Raul no banco traseiro e rumaram para a clínica Pinel, lá na entrada, já imobilizado na maca, Raul não discernia a realidade das coisas e Luana assinava o prontuário enquanto responsável, mais um episódio de surto do seu futuro marido, dessa vez nada grave, a mesma coisa de sempre, orgias, bebidas e drogas, nada demais. No seu retomou para casa lembrou que no outro dia teria sua consulta com Letícia e precisava ensaiar bem a narrativa, para não ser surpreendida como cúmplice de três assassinatos, procurou nos noticiários algo relacionado pelo desaparecimento, m, mas lembrou de que já haviam se passado quinze dias e que nada de novo aconteceria, mais um desaparecimento sem solução, aliás, a solução era apenas uma, manter Raul longe da sociedade, mas isso era um detalhe apenas do conhecimento de Luana e ninguém mais. A psicanalista Letícia, a quem ela confidenciou as narrativas envolvendo Raul e seus crimes, sempre em tons ficcionais ou que ouviu alguém comentando, dava-lhe dicas precisas de como não se envolver mais e sempre deixava claro que era uma cúmplice e que esse fato fazia com que seu débito com a justiça e a sociedade crescesse cada dia.

Sentia alguma culpa por tudo aquilo, mas nada que pudesse fazê-la modificar a realidade. Chegando ao apartamento avisou a secretária de Raul de que este estaria indisponível por uns três meses, nada além do que sempre acontecia. Na consulta com Leticia tentou transparecer suposta tranquilidade, durante a conversa notou que Letícia parecia atenta nos detalhes de sua roupa e outras coisas que antes pareciam insignificantes, como sua marca de bolsa e seu cabelo bem alinhado, enfim achou um tanto curioso, mas os psicanalistas eram assim mesmo, um tanto estranhos e numa havia sido interpelada por ela com semelhantes detalhes, curiosos, mas anda alarmante. Saiu do consultório, queria chegar em casa, tomar um calmante e tentar dormir o mais rápido possível, sabia que Raul estava seguro na clínica e que principalmente, seu segredo seguia em segurança com ela.

Ainda pensativa sobre as tantas perguntas da psicanalista sobre sua indumentária e outras coisas e sobre a data do casamento, foi se trocar. Sentou-se na poltrona e quando olhou para o chão, tomou-se de horror e surpresa, estava ela vestindo as mesmas botas que esteve no sítio, chuvas de barro e com alguns pingos de sangue. Apavorada, não havia trocado o sapato, eis que caminhou pela clínica psiquiátrica e depois foi a consultório da psicanalista com as mesmas botas. Precisava livrar-se daquelas botas. Rapidamente, colocou o par de botas num saco de lixo preto e na manhã seguinte, ao dirigir-se para sua aula de Yoga, passou pelo parque da Redenção, fingindo parar para uma caminhada matinal, estacionou o carro e caminhando até o container mais próximo arremessou a bolsa preta contendo as botas e seguiu sua caminhada. Os noticiários policiais anunciavam novo desaparecimento de prostituta depois de orgia, nada demais para a rotina violenta de uma capital, ao ouvir a notícia, Luana desligou o rádio e adentrou na sua aula de Yoga, tranquila e serena. Letícia, enquanto organizava as anotações dos pacientes do dia anterior. Recordava a sujeira das botas de Luana e aquelas gotas vermelhas na ponta parecendo sangue, algo nada comum para uma paciente tão organizada. Raul seguia na desintoxicação, o casamento fora transferido para o final do ano. Tudo seguia normal, exceto a inspetora de polícia, Betina, que não tirava da memória as botas sujas da paciente anterior a ela, que havia saído da sala da psicanalista um tanto agitada no dia anterior, coisa estranha uma moça tão organizada estar com as botas tão embarradas àquela hora, mas coisas estranhas são comuns no dia-a-dia. 




Conto escrito por
Gabrielle Mastella de Oliveira

Produção Four Elements
Marcos Vinícius da Silva
Melqui Rodrigues
Hugo Martins
Cristina Ravela



Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


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