0:00 min       ERA UMA VEZ...     CONTO IV
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ERA UMA VEZ...



Antologia de
Hugo Martins

CONTO IV
O VILÃO




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O VILÃO


 Era uma vez um velho cadeirante, que vivia em uma mansão luxuosa, no alto da colina.


Sigmund Vilão era um magnata do petróleo. Ranzinza, cruel e egoísta, vivia seus dias lendo e fazendo aplicações financeiras.

Sua maior ambição: tornar-se uma memória eterna na mente das pessoas. Não queria morrer e ser esquecido.

Sem esposa ou filhos, sua única companhia era um japonês fiel que administrava seus negócios.

Tudo mudou, quando em uma tarde ociosa, Sir Vilão pegou-se revirando a biblioteca, e encontrou livros antigos, calendários maias e hieróglifos raros. Mas, um livreto específico, chamou-lhe a atenção. Uma antologia de contos chamada Era uma Vez. Percorreu as páginas envelhecidas e encantou-se com as figuras, aproximou-se da janela e leu todas as histórias. Ficou admirado.

A capa anunciava uma série de quatro contos, mas ali só tinham três. Ficou curioso para saber qual era o último. Ligou para a editora e falou com uma mulher chamada Cristina, soube que não existia um quarto conto, o autor nunca fizera. Frustrou-se. Pediu o contato do escritor e ligou para ele.

Hugo Martins, autor da série, atendeu ao telefone mal humorado. Desempregado, e vivendo um bloqueio criativo, não queria conversar sobre um projeto fracassado. “Publicamos dez exemplares, nada demais. Onde encontrou isso?”, ele perguntou.

“Em minha biblioteca”, disse Vilão.

“Esqueça o livro, ele não é bom”.

“Mas eu adorei as histórias”, Sir Vilão disse para uma voz muda do outro lado da linha. Hugo havia desligado.
Naquela noite, não conseguiu pregar os olhos, pensando nas aventuras que lera. Desejou vive-las também.

Ao amanhecer, pediu que japonês investigasse as fontes de inspiração do autor. Queria saber tudo sobre Hugo e suas criações. Enquanto esperava, continuou lendo e relendo os contos. Apaixonado, deslumbrado.

Encantou-se com o romance de Selena e o trágico fim de César Augusto. Surpreendeu-se com o mundo perdido de Albert e como ele vencera Boxo, o proclamador. E, não conteve a emoção ao embarcar nas aventuras de Zule e seu gigante Tapuã.

Em todas as histórias, percebeu que os vilões eram vencidos no final. Pensou que seria divertido ler sobre a jornada do vilão, e como ele triunfara. Mas, esse conto não existia, ainda não fora escrito. “Seria errado desejar ver o mal triunfando no fim?”.

Em busca das respostas, não conteve a ansiedade quando Japonês retornou trazendo as notícias.

Soube que todas as histórias eram verídicas, e que realmente Selena, Albert e Zule existiam. Inclusive Boxo continuava preso e Tapuã dormindo.

Tremeu com a novidade. Há tempos não sentia tamanha euforia. Precisava fazer algo com a ideia genial que brotara em sua mente. Iria entrar na história através da antologia.

“Todos esses heróis estão vivos e felizes, enquanto que os vilões estão presos ou dormindo. E eu, próximo da morte, preciso fazer parte desse universo”, pensava.

Com uma ideia fixa na cabeça, decidiu que se tornaria o quarto conto da série. E sua história, seria a melhor de todas, pois ele não faria o mocinho, mas sim o vilão, e não morreria no fim, isso nunca.

No dia seguinte, ordenou que Japonês trouxesse à mansão o autor Hugo Martins, oferecendo-lhe emprego. Aguardou ansioso, enquanto ensaiava seus atos de crueldade.

Infelizmente, estava condenado à cadeira de rodas, e não poderia lutar e esganar os mocinhos, mesmo assim, tinha poder e dinheiro, para executar suas vilanias.

Hugo Martins relutou em aceitar o convite de Sigmund Vilão. Mas, como estava sem grana e louco pra trabalhar, decidiu arriscar e descobrir os projetos do velho.

Quando chegou à mansão, foi recepcionado com um banquete regado a vinho branco e caviar. Ficou deslumbrado com o tamanho da mansão e com a opulência que o magnata ostentava.

Encontrou-se com Sir Vilão na biblioteca, e ficara compadecido pela situação do velho. “O que será que ele quer?”, pensava.

O anfitrião fumava um charuto quando o autor apareceu. Sereno, pediu que ele sentasse em uma das poltronas. Precisava convencê-lo a lhe incluir nas histórias.

“Escreva o quarto conto”, pediu.

“Não tenho mais histórias para contar”, Hugo respondeu.

“Conte a minha história”.

“E qual é a sua história?”, o autor perguntou, cruzando os braços.

Hugo realmente queria saber qual era essa história. Estava curioso para descobrir porque um velho ricaço contaria algo. Será que existia alguma grande aventura?

“A minha história é a história do mal. Irei matar os mocinhos. E no fim você irá escrever como eles foram derrotados e como eu os venci”, disse Sigmund.

“Essa é uma péssima história. Será a pior de todas”, Hugo sorriu, encarando o velho.

Vilão formou uma interrogação na testa; queria saber o porquê de sua história ser ruim?

“Você tem poder, tem riquezas e mata todos os bonzinhos. E depois? O que acontece? Você triunfa sobre o bem e domina todos? Fica sentado em um trono contemplando o quão horrível tornou-se? É isso? Como essa história pode ser boa?”.

“Não sei! Diga-me você, que é o escritor!”, exclamou o Vilão, percorrendo a sala.

“Se eu soubesse as respostas, já teria escrito o último conto”.

“Você deve saber como criar boas histórias. Pense em algo e eu irei fazer”, ordenou Sigmund.

“Uma boa história é repleta de conflitos. Existe aprendizado, romance, humor e transformação. Mas, isso não é fácil de fazer”, refletiu.

Sigmund estava inconformado. Só precisava querer e em poucos minutos Selena, Albert e Zule estariam mortos. Depois, Hugo escreveria seu triunfo e o conto estava acabado. Mas, realmente qual seria a graça?

“Eles precisam lutar”, disse Sigmund para o autor.

“Sim, mas antes ele devem estar preparados”, completou Hugo.

“E, como isso será feito?”

“Envie-lhes cartas. Avise-os de que estão em perigo e que precisam lutar por suas vidas. Eles encontrarão uma forma de se prepararem”, aconselhou Sigmund.

Hugo teria que concordar com Vilão, era uma boa ideia. Dessa forma, escreveu cartas para Selena, Albert e Zule e pediu que Japonês levasse até aos correios. Naquela mesma noite, Vilão ficou pensativo, olhando os jardins através da janela. Hugo tentou se aproximar e conversar, mas ele estava fechado em si.

Dois seguranças conversaram com Vilão e em seguida tomaram Hugo à força e lhe algemaram. “O que você está fazendo?”, ele perguntou.

“Mudei de ideia. Não irei preparar ninguém para a luta, eles morrerão impiedosamente, sem batalha final”, disse Sigmund, com uma névoa negra em sua face.

“Você é um covarde!”, Hugo bradou.

Os seguranças jogaram o autor em um calabouço, no subterrâneo da mansão. Logo em seguida, informaram a toda equipe, a missão de matar Selena, Albert e Zule. Vinte homens armados partiram para a mansão no alto do monte. A primeira vítima seria Selena, a ruiva.


Selena

Na mansão no alto do monte, Selena morava com o marido e o filho recém-nascido. Naquela manhã, acordou cedo e amamentou a criança. Seu marido abraçou-lhe por trás e observou o bebê no colo da mãe. “Vocês são tudo pra mim”, disse apaixonado.

O casal observava o nascer do sol através da janela e planejavam o futuro. Mal sabiam que uma ameaça era chegada.

No meio do dia, um carro preto estacionou diante do portão de ferro. Carlos, o marido de Selena, foi atender. Enquanto ela observava a cena da sala de estar.

Assustou-se quando viu os homens pularem do carro e atirarem em seu esposo. Seu coração correu em disparada, um tremor percorreu seu corpo, “aquilo não estava acontecendo”, pensou. Tomou o filho nos braços e em disparada correu para os fundos da mansão, onde ficava o jardim.

Os homens derrubaram a porta, invadindo a casa. Apontaram armas para todos os cômodos, procurando a mulher como se caçassem um bicho da mata. “Apareça!”, gritavam como leões ferozes. Foram aos fundos da mansão e se aproximaram do jardim, “não havia sinais dela, onde teria ido?”, perguntavam entre si. Desistiram depois de muito buscarem. Deixaram a mansão.

No jardim, quando tudo se acalmou, uma rosa brilhou e se transformou em mulher. Selena segurando seu filho no colo; chorava a perda do marido. Pelo menos havia escapado com vida para cuidar da criança, mas não entendia o motivo de tamanha brutalidade. “O que aqueles homens queriam?”, pensava.

Foi até o corpo do amado e ajoelhou ao seu lado, lamentou. Em um braço segurava o nenê, no outro, a cabeça do marido sem vida. Sentiu uma lança de pesar penetrar em seu coração.


Albert

A escola de música borbulhava de alunos. Albert passava os dias correndo entre as classes e a coordenação, aquilo era tudo pra ele. Seus filhos lhe ajudavam dando aula, e sua esposa cuidava da parte artística, estúdio e venda de produtos. Tudo permanecia na mais perfeita paz, até aquela manhã de sexta-feira.

Os homens de Sigmund Vilão estacionaram diante da escola. Mal-encarados, desceram armados e invadiram o lugar. Pelas câmeras, Albert percebeu a ameaça, e tirou do armário a sua arma, o violão.

O músico não esperou que os homens lhe procurassem, e foi logo se apresentando. “Eu sou Albert, quem são vocês?”. 

Apontaram as armas para ele e lhe ameaçaram de morte. Mas, Albert dedilhou as cordas da viola e algo aconteceu. Os homens ficaram petrificados, só mexiam as pálpebras. Mas uma acorde e eles caíram sem reação.

Chamou a polícia e levaram os homens esquisitos. Agora, buscava saber quem eles eram e por que queriam lhe matar? Não sabia que tinha inimigos, ficou curioso para entender o que acontecera ali.

Enquanto os homens de Vilão se planejavam para executar Zule; na mansão, Hugo permanecia no sótão, encarcerado, preocupado e sem ter notícias nenhuma do mundo externo.

Mas, certo dia, Sigmund apareceu por lá. Vindo das sombras, o velho arrastava sua cadeira, trazendo consigo a imponência que tem os homens maus. Ele encarava o autor, tentando iniciar um diálogo.

“Trouxe-lhe um presente”, disse o Vilão, mostrando uma máquina de escrever em seu colo.

Hugo permanecia em silêncio, ouvindo o som de uma brisa entrar pela janela.

“Você precisa começar a escrever”, disse Sigmund.

“Não! Chega de mortes. Não vou escrever nada!”, gritou, agarrando as barras da cela.

“Você não tem escolha”.

“Eu sempre tive, e sempre terei. Essa não é a história que quero escrever”.

“Qual história então? Diga-me, qual a minha história?”, perguntou Vilão, quase numa súplica.

“Você não é um personagem atraente. É velho, aleijado, egoísta e solitário. O que você tem a acrescentar ao mundo?”.

Os olhos de Sigmund baixaram em reflexão. Tremeu os dedos no braço da cadeira e em seguida apoiou o queixo na mão direita. “Que história gostaria de contar, então?”, ele perguntou, realmente interessado.

“Uma história sem mortes!”.

“Mas as suas histórias têm mortes”, retorquiu o Vilão.

“São mortes inevitáveis, causadas pelos antagonistas”.

“E, se as mortes não forem causadas pelos antagonistas, isso faria a diferença?”

“Não, Sigmund, não há diferença. Nas minhas histórias não haverá mais mortes”, disse o autor, determinado.

Enquanto isso, na delegacia de polícia, cinco homens eram investigados por tentativa de homicídio do Sr. Albert. No depoimento que deram, os seguranças confirmaram o nome do mandante.

“Quem mandou executar as mortes, foi o Senhor Zule Inteiro”, diziam os homens.

“Peguem o Zule”, ordenou o delegado responsável.


Zule Inteiro

O carteiro deixou o envelope na caixa do correio e continuou seu trabalho indo para a casa vizinha. Zule acordou cedo e verificou a correspondência. Abriu o envelope e assustou-se com o que viu. Eram fotos de Selena e Albert, seus endereços, dados sigilosos, documentos entre outras coisas.

“Que merda é essa?”, Zule perguntou-se.

Ainda segurando a correspondência, Zule observou quando um carro preto estacionou diante da casa, e um cadeirante desembarcou; era um senhor de feição endurecida, olhos focados e ar maquiavélico.

“Elas chegaram em bom estado?”, perguntou, Sigmund Vilão à Zule, apontando para o envelope.

“Sim, foi o senhor quem as enviou?”, perguntou.

“Sim, fui eu. A polícia irá chegar em poucos instantes. Irão te interrogar sobre as tentativas de assassinato de Albert e Selena, você os conhece?”.

“Eu... não sei o que você quer dizer? Por que a polícia vai me interrogar? E, eu sei quem são Albert e Selena. Estamos na Antologia Era Uma Vez”, disse Zule, com dúvidas no tom de voz.

“Quero que você, seja o vilão, do último conto que o Hugo Martins está escrevendo”, confessou Sigmund.

“Eu não sou vilão. E, essa história toda soa muito estranha”.

“Você tem cinco minutos para aceitar ser o vilão, ou não. Se não aceitar, irá morrer. Albert e Selena irão te matar”.

“Eles não fariam isso. São boas pessoas. E, eu não sou um vilão. Chega dessa conversa louca, tenho que ir”, disse Zule, sem antes escutar a sirene da viatura se aproximando.

“Você aceita, ou não?”, Vilão perguntou pela última vez.

“Claro que não!”.

Ao dar as costas para Vilão, Zule sentiu uma fisgada no pescoço, e ao por a mão no local, percebeu um dardo preso em sua pele. Uma tontura lhe enfraqueceu as pernas. Os braços ficaram dormentes. Caiu sem forças no gramado.

Logo em seguida, Vilão aguardou no carro, enquanto seu segurança carregava o corpo de Zule. Pelo retrovisor, ele observou o garoto dormindo no banco de trás. Seu plano estava dando certo.

Algumas horas depois, Zule acordou com o chacoalhar do carro. Tudo girava ao redor, e o pão com café que tomara de manhã estava prestes a ser vomitado. Seu corpo parecia que fora moído e sugado; não estava bem. Percebeu Sigmund Vilão sentado no banco do carona. Ele tinha a cabeça erguida como um pavão real e as peles do pescoço moles como geleia de morango.

“O que você quer afinal?”, Zule perguntou, com a voz rouca e falha.

“Quero ser o próximo conto da antologia ‘Era uma vez’. Para isso, irei matar você, Selena e Albert, pois quero ser o vilão da história. É dessa forma que deixarei meu legado no mundo”, respondeu Vilão, com um hálito de hortelã.

“É um absurdo! Você irá me matar e matar os outros, essa não é uma boa história. Você nem tem uma motivação real para fazer isso! Você sabe pelo menos por que quer nos matar? Como isso te torna um vilão convincente? Nas boas histórias, os vilões querem vingar-se de alguém, ou conquistar o mesmo objetivo que o herói, e para que isso aconteça, eles pisam em tudo e em todos. Mas você? Fala sério, não tem uma motivação real. Isso soa patético e artificial. Existem outras maneiras de tornar-se um legado, e matar, definitivamente, não é a melhor maneira”, ele disse de forma relaxada e convincente.

Vilão coçou a cabeça parecendo incomodado com aquele argumento, de certa forma fazia sentido; matar todos e tornar-se o grande vilão não era uma grande jogada, mas era uma jogada, ele tinha que assumir.

“Posso propor a seguinte reflexão: que tal pensar nas suas verdadeiras aspirações? Você é rico? Você tem instrução? Tem família? Sonhos? O que você ainda não conquistou, mas gostaria de conquistar? Já construiu um grande monumento? Escreveu um livro? Do que se arrepende?”, Zule pergunta, transmitindo toda a confiança de um terapeuta.

“Tudo o que eu fiz com a minha fortuna, não foi capaz de trazer o meu amor de volta. Eu queria ter meus vinte anos novamente, e encontrar meu verdadeiro amor”, ele confessa, parecendo realmente refletir nas ideias de Zule.

“Seu legado não é de destruição, mas sim de redenção! Você pode aceitar quem você é, o que você construiu, e as decisões que tomou para realmente encontrar a paz. Quem sabe não consiga encontrar seu grande amor na terceira idade?”

“Você é o contador de histórias não é? Tem um grande poder de persuasão em suas palavras. Isso é perigoso sabia? Você pode fazer besteiras com as palavras!”, responde Sigmund, totalmente inclinado para Zule.

“Isso quer dizer que você vai pensar no assunto?”

Antes que Vilão pudesse responder, os dois se assustaram quando o carro freou sacudindo-os.

“Onde estamos?”, Zule perguntou, com o rosto colado na janela tentando ver o exterior.

“Na minha mansão”.

Os dois caminharam até o saguão de entrada, foram à sala, e sentaram um de frente para o outro. Sigmund definitivamente estava pensativo. Mãos apertando os lábios, como se as ideias pudessem escapar pela boca.

“Não posso matá-los”, concluiu Vilão. “Seria uma péssima história”.

“Sim! Você deve encontrar a redenção!”.

“Mas também não posso continuar sem reparar os meus erros”, ele disse, para em seguida ordenar que Japonês libertasse o autor Hugo Martins.

Zule deu um salto, quando Hugo se aproximou ainda algemado. O próprio Sigmund destravou as algemas que prendiam o autor.

O Vilão pediu desculpas a Hugo e a Zule, disse que estava velho e imprudente. Não queria mais viver de forma impune, como sempre fizera, antes precisava se responsabilizar por seus erros e reparar os danos causados a outros.

“Com isso em mente, eu gostaria de indenizar todos vocês que foram envolvidos nas minhas loucuras, e me entregar às autoridades”, disse Sigmund, tremendo e derramando uma lágrima. “Por toda minha vida, eu esperei que alguém me dissesse o que não fazer, ou que eu estava errado, mas elas só diziam o quão rico e próspero eu era. Mas, com vocês foi diferente, eu pude abrir os olhos e perceber que sou um velho precisando de correção, por isso quero acabar com isso”.

“O que o senhor propõe para corrigir seus erros?”, perguntou Japonês.

“Prepare declarações indenizatórias. Vou pagar os danos que causei a todos vocês. Quero pagar em dinheiro os meus deslizes”, propôs, Sigmund.

“Você também nos deve desculpas!”, disse Zule.

“Sim, chamem as autoridades, além de Selena e Albert aqui. Vou me desculpar pessoalmente por tudo”, concordou Vilão.   

Zule conseguiu falar com Selena e Albert; os dois estavam na delegacia denunciando os ataques que sofreram. Ele pediu que viessem à mansão de Sigmund com os policiais, explicou que Vilão tinha desistido de matá-los, queria indenizá-los e pedir desculpas.

Os dois ficaram desconfiados da mudança do Vilão, mas decidiram junto com a polícia ir à mansão do magnata e testemunhar a prisão.

Um verdadeiro batalhão foi convocado para prender Sigmund Vilão. Tropas do exército estavam a postos, helicópteros foram acionados, carros blindados e armamento pesado, ele que não tentasse nenhuma besteira.

No interior da mansão, Japonês chorava sem acreditar que o patrão seria preso. Pelo menos suas filhas teriam a faculdade paga e uma parte da herança no testamento do magnata. Mas, o desconsolo era sem igual, pois iria perder seu chefinho.

A polícia cercou a mansão como formigas cercam o melaço caído no chão. Dois helicópteros sobrevoavam o lugar vigiando dos céus a operação especial. Outra equipe de elite entraram na casa acompanhando o delegado e as duas vítimas.

Apontando a arma para Vilão, o delegado mandou algemá-lo. Sigmund baixou a cabeça como se estivesse prestes a derramar lágrimas, mas nada aconteceu; somente seu olhar vazio permaneceu ainda mais insignificante.

Zule abraçou Selena e Albert. Era a primeira vez que se encontravam pessoalmente. Hugo se aproximou do delegado e disse que eles precisavam assinar as declarações indenizatórias e que Sigmund queria se desculpar. O delegado concordou prontamente com tudo, antes de levar Vilão em custódia.

“É o fim Sigmund! Sei que não é o fim perfeito, mas depois de tudo que refletimos e da conclusão que chegamos, é o fim adequado. Todos saem transformados dessa experiência. Agora... gostaríamos de ouvir as suas sinceras desculpas”, disse Hugo, mais formal que de costume.

Selena ainda carregando seu bebê, sentia raiva ao olhar para Vilão. Por causa das loucuras dele, ela havia perdido seu marido. Sua vida nunca mais seria a mesma, ainda que ele pedisse perdão mil vezes.

Percebendo todo esse sentimento de fim que permeava o ambiente, Sigmund sorriu para todos e disse: “Vocês são burros”.

Após isso, um tremor abateu a sala. O lustre balançou e caiu, o teto rachou, e os quadros antes pendurados, soltaram-se todos. Um som de horror ouviu-se lá fora. Som de tiros, e gritos de terror. Uma verdadeira guerra acontecia no pátio externo. Todos correram para as janelas para ver o que ocorria ali.

No pátio externo, um gigante derrubava os helicópteros como se matasse mosquitos no ar. Com suas mãos, afastava as viaturas e os policiais, arremessando-os para longe. Pisando em qualquer ser humano que estivesse ao redor, Tapuã dizimou em poucos minutos toda a tropa que cercava a mansão. O medo paralisou todos que testemunhavam o massacre.

De repente, as balas atravessavam as vidraças da mansão. Uma bomba de gás foi lançada no salão deixando o lugar esbranquiçado com a fumaça. A casa estava cercada; Boxo e seus vinte e dois cavaleiros montados em cavalos brancos estavam armados com fuzis, prontos para exterminarem os inimigos de Sigmund Vilão.

Dentro da mansão, quando a fumaça baixou, todos viram Vilão sentado em sua cadeira de rodas, e por trás dele, Boxo e seu exército de cavaleiros.

“Eu sou o grande protagonista dessa história. Vocês terão que aceitar isso. E, sim, eu sei que o meu ego é muito grande”, gargalhou Sigmund.

No pátio externo, Zule observou toda a grandeza do gigante Tapuã, enquanto era escoltado pelos cavaleiros de Boxo. Albert sentia verdadeiro asco de tudo aquilo, e Selena estava revoltada, pronta para lutar.

“Você mentiu para nós!”, Hugo gritou em direção à Vilão.

“Não! Eu darei a chance deles lutarem antes de morrer. As coisas só não foram como você imaginou, mas elas foram”, disse Vilão para Hugo.

Hugo observava todo aquele espetáculo, e as lutas entre gladiadores em um coliseu era o que lhe vinha à mente. 

“Como Sigmund conseguira trazer para si Boxo, o proclamador, e Tapuã, o gigante?”, perguntava-se. “E como eles poderiam lutar contra um gigante e vencer?”.

O palco estava montado. De um lado Sigmund liderava Tapuã e Boxo, seguidos pelos vinte e dois cavaleiros montados em cavalos brancos. Do outro, Selena, Albert, Zule e Hugo, indefesos e sem poder de fogo. Era uma luta desproporcional, uma guerra perdida, não havia como vencer.

“Estão prontos?”, perguntou Vilão, do alto de sua arrogância. “Lutem!”, ordenou.

Sem nenhuma estratégia, Selena foi a primeira a reagir. Enfiando a mão na terra, ela acordou as raízes das árvores e rosas que dormiam no escuro do solo. Tais raízes agarraram os braços de Tapuã, imobilizando-os. Isso deu tempo para que os outros pudessem lutar contra Boxo e seus cavaleiros.

Enquanto isso, Albert voltou para a mansão tentando encontrar algum violão, em busca de paralisar os inimigos. E, Zule sem nenhuma habilidade de batalha, tentava destravar uma arma que encontrara jogada - mas sem sucesso.

Tapuã se revirava tentando se desvencilhar das raízes, até que com esforço arrancou-as de si e espremeu-as como se espremem roupas lavadas.

“Invencível!”, gritava o gigante, estremecendo tudo com sua voz de trovão.

O delegado foi abatido, e todos outros capturados pelos cavaleiros de Boxo. Em seguida, foram levados à presença de Sigmund Vilão, que gargalhava com o fiasco que fora a batalha.

“Isso foi ridículo. Nunca deveriam tentar lutar contra alguém maior, mais forte e mais poderoso do que vocês. Agora, chega de brincadeira, vamos à execução!”, exclamou Vilão, com ar de triunfo.

“Velho idiota!”, gritou Selena.

Boxo, montado em seu cavalo branco, conduziu os personagens para o centro do jardim. Todos se ajoelharam, e fuzis foram apontados para as suas cabeças.

Naquele fim de tarde, uma brisa suave soprava e balançava os cabelos castanhos de Selena. A mesma brisa enxugava uma lágrima que caía dos olhos de Hugo, e inspirava um argumento na mente de Zule. Eles foram subjugados, humilhados e massacrados. Seu sangue serviria de tinta para escrever a história de um tirano, vidas inocentes seriam exterminadas.

“Estão prontos?”, Vilão perguntou. “Quais são suas últimas palavras?”.

Nesse instante, Zule levantou a cabeça e com palavras vindas do céu disse: “Existe algo mais glorioso do que a nossa morte. Existe um caminho mais alto que poderá leva-lo à imortalidade. Se permitir posso guiá-lo ao fruto dos deuses e lhe oferecer poder supremo e inesgotável. Nações, reinos e povos se prostrarão diante do seu poder. Homens, mulheres e crianças lhe adorarão; você será um deus sobre a terra”.

“Do que você está falando?”, Sigmund perguntou.

“Falo do fruto dos deuses, aquele mesmo fruto que você leu no meu conto”, respondeu Zule.

Ao ouvir as palavras de Zule, Sigmund virou-se para o gigante e seus olhos brilharam.

“Não é possível!”, espantou-se Sigmund.

“Se nos deixar viver, poderei guia-lo até à cabeça do gigante e lhe mostrar o fruto divino”, disse Zule.

“Você ainda lembra o caminho?”.

“Eu nunca o esqueci”.

Sigmund dirigiu-se até o gigante, e pediu para entrar em sua cabeça. Tapuã, então lhe negou o pedido, dizendo que precisava dormir novamente.

“Posso conseguir lhe um lugar de descanso. Diga-me onde queres descansar e eu lhe proporcionarei o lugar”, respondeu Vilão.

Tapuã respondeu que no oceano seria o lugar ideal. Disse que precisava recuperar seu sono por dez mil anos. Vilão jurou que o oceano seria sua cama eterna e que ninguém mais lhe perturbaria. Os dois selaram um acordo.

O gigante deitou-se no chão para que o grupo entrasse em sua cabeça pelo ouvido. Zule caminhava na frente junto de Sigmund, enquanto que Albert, Selena e Hugo eram escoltados por Boxo.

O grupo seguia a trilha em silêncio, até chegarem ao lago ácido de piranhas assassinas. Com uma ordem de Sigmund, Tapuã engoliu o lago, tornando o espaço em uma cratera seca.

Ao se aproximarem das armadilhas da tarântula, Zule guiou o grupo para uma vereda segura. Mesmo assim, a aranha gigante surgiu diante deles, somente para ser fuzilada pelas mãos de Boxo, o proclamador.

Até que enfim chegaram ao salão das máscaras, próximo ao oráculo em que estava o fruto.

Com um golpe de agilidade, Serena pulou de encontro a Boxo e tirou-lhe a arma da mão. Percebendo a ação da mulher, Hugo e Albert correram e imobilizaram o proclamador. Agora, Selena apontava a arma em direção à Vilão enquanto andava ao seu encontro.

Sigmund ficou surpreso quando a garota agarrou o jovem Zule e apontou o fuzil para a cabeça dele.

“Ninguém mais chegará ao fruto”, disse Selena, destravando a arma.

“O que você está fazendo Selena?”, Sigmund perguntou, com um olhar sombrio.

“Eu vou matar Zule”, ela disse.

Hugo e Albert encararam a moça sem conseguir falar nada. Selena continuava apontando a arma para a cabeça de Zule, pronta para matá-lo.

“Tem algum problema pra você, se eu matar ele?”, Selena perguntou para Vilão.

“Ele é o único que sabe onde está o fruto e como nós podemos sair daqui. Sem ele estamos perdidos”, argumentou Sigmund.

“Mas você disse que iria nos matar. Qual a diferença dele morrer agora ou daqui a duas horas?”, ela perguntou.

“Ele é útil para mim”, disse Vilão.

“Útil coisa nenhuma! A questão é que ele morrendo, você corre o risco de morrer. O que importa é a sua vida e não a dele! Seu egoísta. Como você pode querer preservar a sua vida, quando intenta tirar a vida de outra pessoa? Qual a importância de uma vida pra você afinal?”.

“Você também pode morrer aqui comigo. É isso que você quer?”

“Não! Eu quero matar ele, porque eu quero ser lembrada como aquela que matou todos os personagens da antologia”, esbravejou.

“Você é incrível! Mas é isso que eu queria fazer”, disse Vilão.

“Eu vou te ajudar. Vou começar matando o Zule, e depois mato você”.

“Você não pode fazer isso!”

“Eu não posso, mas você pode! Quem diz o que eu ou você podemos fazer?”.

“Ele não pode morrer agora, por que ele é útil para mim. Ele vai nos levar à glória”.

“O Zule não tem nenhuma utilidade pra mim. Quem decide a utilidade? Eu ou você? Qual a utilidade de alguém? Qual a razão do Zule estar aqui agora?”

“Ele está aqui para nos guiar ao fruto divino”, gritou Sigmund.

“Não, eu digo que ele está aqui para morrer por minhas mãos!”, ela retrucou.

“Você não pode decidir quem deve matá-lo”.

“E quem pode decidir? Você, ou a maioria?”

“A vida dele não lhe pertence”, disse Sigmund.

“Agora você chegou onde eu queria”, ela falou, livrando Zule.

No mesmo instante, Boxo deu um salto, livrando-se dos que lhe imobilizavam, e apontou uma arma para Selena. Ele gritou ordenando que ela soltasse o fuzil. Antes que ela pudesse fazer algo, ele atirou em sua mão, derrubando a arma.

Boxo se aproximou de Vilão e ameaçou todos os outros, ordenando que eles marchassem até o fruto. Ao chegarem ao centro nervoso, encontraram o fruto que pulsava uma cor vibrante e avermelhada.

O oráculo fechou-se com todos lá dentro. Alguma coisa acontecia no exterior do corpo do gigante. Tremores abalavam a estrutura do oráculo onde todos estavam.

Enquanto Sigmund tentava comer o fruto divino, lá fora, a Força Nacional cercava a mansão do magnata e preparava-se para massacrar Tapuã. Os cavaleiros de Boxo foram rendidos, e aviões carregando mísseis sobrevoavam a área, prontos para exterminarem o gigante.

Quando os primeiros disparos começaram a atingir o gigante. Tapuã levantou-se em desespero, vendo-se cercado por todos os lados. Tanques, bombardeiros e lança-mísseis faziam coro com uma chuva de fogos em direção ao monstro.
Tapuã correu em direção ao oceano. Passou por vielas e estremeceu todo o continente. Destruiu cidades inteiras e afundou montes pelo caminho. Ao chegar ao mar mergulhou de cabeça, entrando nas águas profundas e descendo até o abismo frio do oceano. Sangrando muito e repleto de ferimentos, Tapuã foi morrendo aos poucos até congelar no fundo das águas, no escuro do abismo, próximo ao centro da terra. Um lugar inalcançável pelo homem. Um lugar que nenhum ser natural poderia acessar. Um lugar tão profundo que nem mesmo um gigante conseguiria sair. Mesmo assim, Tapuã estava morto, no fundo do mar, sem possibilidade alguma de retornar, e o pior de tudo: Selena, Albert, Zule e Hugo estavam lá, presos na cabeça do gigante. Presos para sempre.

Agora, com o fruto divino nas mãos, Sigmund percebeu que estava em um beco, ou melhor, em um buraco sem saída. Nas profundezas do mar, não conseguiria sair nunca, a não ser que o fruto pudesse lhe proporcionar algum poder extraordinário.

Sem mais delongas, pegou o fruto e mordeu um pedaço generoso. Mastigou com avidez e aguardou que o sobrenatural acontecesse, mas tudo permanecia da mesma forma.

“Você me enganou!”, esbravejou Vilão para Zule. “Tudo permanece do mesmo jeito. Qual o poder que tem esse fruto?”

“Não sei! Algo deveria acontecer! Talvez Tapuã esteja morto, e por isso não surtiu nenhum efeito”.

Dentro do oráculo, estavam os dois vilões: Sigmund e Boxo. E os três heróis: Selena, Albert e Zule, além de Hugo que observava tudo com um misto de medo e fascínio.

“Meu Deus, e agora o que faremos presos no fundo do oceano dentro da cabeça de um gigante?”, Hugo se perguntava.

Olhos desconfiados passeavam de um lado para o outro. As mentes trabalhavam incansáveis tentando encontrar uma maneira de manter a sanidade. Aquele lugar parecia encolher-se cada vez mais, e um fio de água fria infiltrava-se pelo chão.

“Valeu a pena nos trazer até aqui?”, Selena perguntou a Sigmund.

De repente, uma fumaça verde caiu do teto curvado. Ao inalarem aquela fumaça, todos caíram sem forças, e dormiram um sono profundo.

Algumas horas depois, ou dias talvez, pois eles já não tinham mais noção de tempo, acordaram assustados e morrendo de fome.

Boxo procurou seu rifle e achou a arma estraçalhada nas mãos de Hugo. O proclamador ainda tentou lutar, mas estava fraco, sem ânimo.

“Acho que estou ficando louco”, disse Albert em um delírio.
Fome, dor e desesperança. Todos estavam caídos, corpos jogados ao chão enlameado, lábios ressecados e mente cansada. A cena era de desilusão.

Boxo caiu morto. Zule ainda tentou reanima-lo, mas também não tinha forças para nada. Vilão, arrastando sua cadeira de rodas, se aproximou do proclamador e fechou seus olhos.

“Esse não era o fim que eu imaginava”, declarou Hugo.“Parece que nada faz sentido. A morte não faz sentido. Qual o propósito da vida? Se todos morrem, por que existe vida? Se não há razão na existência, por que viver? E se o fim é a morte, nada faz sentido!”, delirava.

“Você só precisa terminar o conto, Hugo”, disse Sigmund.

“Eu não consigo! Nada faz sentido!”, Hugo respondeu.

“Eu sou o sentido. Eu estou aqui para que haja um sentido”, disse Vilão.

“Não compreendo”.

“O bem só pode existir se o mal também existir”, respondeu Vilão. “Vejam todos vocês: tudo começa com Selena tendo um grande amor em sua vida. Eu nunca tive um grande amor, e quando pude amar alguém, meu pai disse que eu deveria priorizar minha carreira, então, desisti do amor. Depois, tudo se volta para Albert vivendo o seu sonho de ser músico. Eu nunca pude viver os meus sonhos, os meus projetos, os meus desejos. Meu pai disse que eu deveria cuidar da sua empresa de extração de petróleo, e eu não tive escolhas, ou melhor, escolhi o que meu pai determinou. E, por fim, Zule me representa, buscando a fama, o dinheiro, o sucesso e sendo despedaçado no meio do caminho, tornando-se uma aberração ambulante para no fim não comer o fruto dos deuses. Agora, estamos aqui, no lugar mais profundo do oceano, no âmago do ser, na questão central das nossas vidas. O que faremos com a morte? O que faremos com o fim de tudo?

“Você matou o homem da minha vida, como eu posso viver com isso? Como você explica isso?”, Selena perguntou a Sigmund.

“O amor é duro como a morte. Ele sempre vem”, respondeu Sigmund. “O homem que você amou, provou que lhe amava mais do que ele mesmo. Ele morreu para que você tivesse vida. Você precisava descobrir que isso é a essência do amor, o auto sacrifício. Quando morremos por quem amamos”.

Selena fechou os punhos. A dor e a raiva explodiram em um choro que vinha da alma.

“E qual a explicação de eu estar aqui?”, Zule perguntou a Vilão.

“Antes de morrer, você precisa resgatar a sua identidade. Você precisa encontrar o seu rosto novamente. Não podemos morrer sem isso. É preciso voltar ao caminho e reparar os erros do passado. Você precisava voltar e encontrar a si”, disse Sigmund para Zule.

Zule sorriu com as palavras do Vilão.

“Tem alguma coisa boa pra mim diante da morte, sr Vilão?”, perguntou Albert.

“Sim! Você é o único que pode nos tirar daqui!”

Todos olharam para Vilão, incrédulos.

“Você sabe como nos tirar daqui?”, Selena perguntou empolgada.

“Sim, mas antes precisamos encontrar a face verdadeira de Zule”.

“E, como sairemos daqui?”, Selena questionou.

Vilão apontou para um pequeno ramo que brotava do chão. Ele olhou para Selena e ela entendeu o que ele queria dizer. 

No mesmo instante, Selena tocou o ramo e uma raiz levantou-se da terra. Com o braço da raiz, ela fez um buraco na parede do oráculo dando acesso ao salão das máscaras.

Todos saíram do oráculo e procuraram a verdadeira face de Zule, porém foi Vilão quem a encontrou.

Muito emocionado, Zule arrancou a máscara que ele usava e sorriu com a sua verdadeira imagem.

“Sinto que agora posso viver de verdade. Sinto que não preciso mais esconder quem verdadeiramente sou. Não há mais espaço para me esconder de mim mesmo. Agora eu tenho meu rosto de verdade”, Zule desabafou.

“Precisamos voltar para o Oráculo”, avisou Vilão. “É de lá que nós escaparemos”.

Antes de entrarem no Oráculo, Vilão pediu que Albert encontrasse um violão, o que ele fez de imediato.

Enfim, quando todos estavam prontos, Hugo perguntou a Vilão de que forma eles escapariam?

“Estamos na cabeça do gigante. Albert só precisa tocar o violão e o cérebro do gigante irá flutuar até a superfície”, respondeu Vilão.

“Isso não pode dar certo!”, disse Hugo.

“Você mesmo escreveu sobre isso, quando Albert estava nas mãos de Boxo foi isso que ele fez. Ele tocou seu violão e cantou, e em seguida os cérebros foram libertos juntamente com os corações”, relembrou Vilão.

“Acho que podemos tentar”, Albert disse com esperança.“Você me acompanha cantando essa canção?”, ele perguntou à Selena, e ela confirmou que sim.

Então, o músico começou a tocar seu violão. Cada dedilhado emanava uma aura de poder e força. Quando a voz de Selena se juntou ao toque do instrumento, a união de voz e violão estremeceu o Oráculo.

“Como você descobriu a forma de sair daqui?”, Hugo perguntou a Vilão.

“Eu comi o fruto divino”, respondeu Vilão.

“E o que isso quer dizer?”

“A verdade me libertou”.

No instante em que o Oráculo começava a flutuar, um buraco se abriu no chão, engolindo todos para o interior do gigante.
Rapidamente, Selena lançou um braço da raiz agarrando-se à parede do Oráculo. Ela segurou seus amigos levando-os novamente para o interior da esfera. Mas, Vilão permanecia caído sobre o chão de neurônios.

Enquanto o Oráculo subia lentamente em direção à superfície, Selena com um ato de misericórdia estendeu sua mão para segurar Vilão, mas algo estava prendendo-o à cadeira e ele não conseguia sair.

“Não! Você precisa me soltar”, disse Vilão à Selena.

“Não vou deixar você morrer aqui”, ela respondeu.

“Vocês devem viver agora. Eu escolho ficar”, disse Vilão, soltando a mão de Selena.

Quando ele soltou-lhe a mão, o Oráculo pode subir lentamente. Todos observavam Vilão preso à cadeira vendo-os flutuarem na imensidão do oceano.

Selena ainda pode balbuciar algo como: “Morra em paz”.

E em conjunto, o cérebro e o coração do gigante, flutuaram até a superfície salvando a todos.

Quando chegaram ao continente, Selena abraçou sua filha e pôs a chorar. Zule sorriu e abraçou sua família, agora com seu rosto verdadeiro. E Albert voltou para os braços dos seus filhos e de seus alunos.

Todos aguardaram a morte em paz.


FIM

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